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janeiro 29, 2013

.demais ou de mais?

Fonte da imagem: AQUI.

Este é um verdadeiro bico de obra da nossa língua. O assunto, mais do que qualquer outro, terá de ser apresentado por pontos para evitar baralhar as ideias. As minhas e as vossas...

1. A maneira mais simples que sempre segui para ajudar os meus alunos a tomar, com um grau de certeza elevado, a decisão certa foi dar-lhes duas dicas:
A. De mais é equivalente a “demasiado”, "a mais” e, ao contrário de demais, é substituível por “de menos”. Exemplo: “Ele come gelados de mais.”
B. Nos casos não abrangidos em A., a opção certa é, muito provavelmente, demais, que pode significar “além disso” (“Não, não te vou perdoar; demais, nem desculpa me pediste!”) ou “os restantes”/“os outros” (“Os alunos da fila junto à porta podem sair. Os demais aguardam mais um minuto.”).
2. Na rubrica “Pelourinho” do Ciberdúvidas (AQUI), Regina Rocha:
a) defende que se deve escrever de mais para exprimir a noção de quantidade (“Nenhuma vida é de mais.”);
b) para exprimir a intensidade (correspondente a “muitíssimo”, “em demasia”), propõe demais (advérbio de modo) como intensificador de formas verbais, advérbios ou adjetivos. Dá como exemplos: «Aquele rapaz dorme demais.» «A jarra é frágil demais; vai partir-se.» «Para aquele pasquim, ele escreve bem demais
3. O FLIP, nas “Dúvidas Linguísticas”, faz uma abordagem aprofundada do assunto, recorrendo a várias fontes. Para Rebelo Gonçalves, por exemplo, de mais pode ser associado a quantidade, mas também a intensidade, contrariando a posição de Regina Rocha (referida no ponto 2.). Transcrevo o parágrafo final da resposta:
Por este motivo, excluindo os dois contextos referidos inicialmente (ex.: entregou a certidão, mas os demais documentos serão enviados pelo correio; considerou o resultado insuficiente, demais nunca gostara daquele serviço), poderá ser opcional o uso de de mais ou de demais. Por outro lado, a expressão de mais pode ainda corresponder apenas à preposição de seguida do pronome indefinido mais, sem qualquer unidade sintáctica ou semântica (ex.: serviu-se de [mais] arroz; a entrada de [mais] pessoas pode criar problemas de sobrelotação; precisava de [mais] dinheiro) e nesse caso, obviamente, não poderá ser utilizada a forma demais.
4. O blogue http://linguamodadoisec.blogspot.pt apresenta uma explicação semelhante à referida em 1., mas acrescenta: “No entanto, tem havido uma tendência crescente para escrever a locução de mais como uma só palavra, a tal ponto, que alguns dicionários, como o Priberam (da Texto Editores), já atestam que demais significa o mesmo que demasiado, assim como algumas gramáticas, como a Saber Falar, Saber Escrever (Dom Quixote), incluem demais nos advérbios de quantidade.
Mais uma vez, conclui-se que os falantes é que vão moldando a língua de acordo com a sua vontade.
5. No Brasil, a tendência é optar, na generalidade dos casos, por demais. Veja esta explicação que encontrei em http://g1.globo.com/platb/portugues/2008/09:
Demais OU de mais?
1) DEMAIS significa “excesso, muito, demasiadamente ou o restante”: “Ela trabalha demais”; “Comeu demais”; “Os demais podem voltar para casa”.
2) DE MAIS equivale a “a mais”, opõe-se a “de menos”: “Recebeu dinheiro de mais (= a mais)”; “Não tem nada de mais (nada de menos)”.
6. Leia uma explicação de Cláudio Moreno (Brasil) mais desenvolvida, clicando AQUI.
7. Para a explicação mais completa sobre o assunto que encontrei (no Ciberdúvidas), clique AQUI.


8. CONCLUSÕES (para toda a lusofonia):
1. Como dica orientadora, transcrevo um extrato do artigo referido no ponto anterior: “Regra prática para escolher a forma adequada: opor de mais a de menos. Se de menos for possível, é natural que de mais também seja possível.”
2. Se estiver em estado desesperado ou em dúvida (mesmo depois de aplicar o teste com o “de menos”), escreva demais!
3. Se for professor(a), seja tolerante, pois esta é uma matéria que não tem nada de simples e as fontes não são coincidentes. Pode aceitar opcionalmente demais ou de mais, exceto quando o sentido for “os outros” ou “além disso”. Aí, só pode ser demais.

Abraço.
AP

P.s. De mais é uma locução adverbial, enquanto demais pode ser um pronome ou um determinante demonstrativo (quando significa “os outros”), um advérbio (quando corresponde a “além disso”) ou um adjetivo (“Ela é demais!”).

4 comentários:

  1. Assim é.
    O «distingo» de Regina Rocha não assenta nos factos da língua nem no exemplo dos escritores canónicos, que escrevem quase sempre «tinha livros de mais» e «lia de mais» e «ria de mais». É cerebrina.

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  2. Comentei no Assim Mesmo (antigo Linguagista), em «Demais/de mais», creio que de 17-12-2010, ou por aí.
    Se fosse agora, tinha-me afastado mais do que então fiz da tese de Regina Rocha. Os factos da língua estão com Rebelo Gonçalves.
    *
    O anterior tb é meu.
    - Montexto

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    1. Pelo estilo (uma espécie de ADN intelectual), pareceu-me que o comentário era seu. Mas como assina sempre, fiquei na dúvida.
      Obrigado pelo comentário neste espinhoso assunto.
      AP

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  3. Vou-me alongando e já receio ter dito de mais.
    Camilo, Anos de Prosa, 1973, XVII, 159.
    *
    E tb escreve sempre «de mais a mais», como outrossim J. de Araújo Correia.
    - Montexto.

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