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abril 26, 2016

Mário de Sá-Carneiro: faz hoje 100 anos que morreu!

QUASE, o poema que prefiro. Um dos mais bonitos (embora triste), o mais universal de todos os que escreveu. 
Excelente interpretação de NOVO CANTO PORTUGUÊS II.


Faz hoje exatamente 100 anos que Mário de Sá-Carneiro se suicidou em Paris, com apenas 25 anos. Numa crescente angústia e perdido no «labirinto de si próprio», envia, em 31 de março de 1916, uma carta a Fernando Pessoa, uma espécie de morte anunciada:
Meu Querido Amigo.
A menos de um milagre na próxima segunda-feira, 3 (ou mesmo na véspera), o seu Mário de Sá-Carneiro tomará uma forte dose de estricnina e desaparecerá deste mundo. É assim tal e qual – mas custa-me tanto a escrever esta carta pelo ridículo que sempre encontrei nas "cartas de despedida"... Não vale a pena lastimar-me, meu querido Fernando: afinal tenho o que quero: o que tanto sempre quis – e eu, em verdade, já não fazia nada por aqui... Já dera o que tinha a dar. Eu não me mato por coisa nenhuma: eu mato-me porque me coloquei pelas circunstâncias – ou melhor: fui colocado por elas, numa áurea temeridade – numa situação para a qual, a meus olhos, não há outra saída. Antes assim. É a única maneira de fazer o que devo fazer. Vivo há quinze dias uma vida como sempre sonhei: tive tudo durante eles: realizada a parte sexual, enfim, da minha obra – vivido o histerismo do seu ópio, as luas zebradas, os mosqueiros roxos da sua Ilusão. Podia ser feliz mais tempo, tudo me corre, psicologicamente, às mil maravilhas: mas não tenho dinheiro. [...]
Menos de um mês depois, no Hôtel de Nice, no bairro de Montmartre, vai-se deste mundo, com o recurso a cinco frascos de arseniato de estricnina.

No ano da morte, escreve o poema "Fim":

Fim
Quando eu morrer batam em latas,
Rompam aos saltos e aos pinotes,
Façam estalar no ar chicotes,
Chamem palhaços e acrobatas!

Que o meu caixão vá sobre um burro
Ajaezado à andaluza...
A um morto nada se recusa,
Eu quero por força ir de burro.

Poeta, contista e ficcionista, foi um dos grandes expoentes do modernismo em Portugal e um dos mais reputados membros da Geração d’Orpheu.
Morreu o homem, viva o poeta!

Abraço a todos.
ProfAP

QUASE
Um pouco mais de sol -- eu era brasa,
Um pouco mais de azul -- eu era além.
Para atingir, faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...
Assombro ou paz? Em vão... Tudo esvaído
Num grande mar enganador de espuma;
E o grande sonho despertado em bruma,
O grande sonho -- ó dor! -- quase vivido...
Quase o amor, quase o triunfo e a chama,
Quase o princípio e o fim -- quase a expansão...
Mas na minh'alma tudo se derrama...
Entanto nada foi só ilusão!
De tudo houve um começo ... e tudo errou...
— Ai a dor de ser-quase, dor sem fim...—
Eu falhei-me entre os mais, falhei em mim,
Asa que se elançou mas não voou...
Momentos de alma que desbaratei...
Templos aonde nunca pus um altar...
Rios que perdi sem os levar ao mar...
Ânsias que foram mas que não fixei...
Se me vagueio, encontro só indícios...
Ogivas para o sol — vejo-as cerradas;
E mãos de herói, sem fé, acobardadas,
Puseram grades sobre os precipícios...
Num ímpeto difuso de quebranto,
Tudo encetei e nada possuí...
Hoje, de mim, só resta o desencanto
Das coisas que beijei mas não vivi...

abril 23, 2016

“Fui eu quem fiz” ou “Fui eu quem fez"?


Encontramos com frequência, lado a lado, as duas construções, mas apenas uma delas está correta. A regra, como vamos ver, é fácil de aplicar e evita que dêmos um valente pontapé na gramática…

RESPOSTA:
O certo é dizer “Fui eu quem fez”!
REGRA (Ciberdúvidas): “Antecedido por pronome pessoal (necessariamente com a função de sujeito), o pronome relativo quem obriga à conjugação do verbo na 3ª pessoa do singular: fui eu quem fez este texto; foste tu quem fez este texto; fomos nós quem fez este texto..."
Obs.: Com QUE é bem diferente, pois faz-se a concordância com o pronome que vem antes: fui eu que fiz, foste tu que fizeste, foi ele que fez, fomos nós que fizemos

A concluir, fui eu quem fez este artigo ou, dito de outra forma, fui eu que fiz este artigo.
Abraço.
ProfAP
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abril 18, 2016

TCHAU QUERIDA ou TCHAU, QUERIDA?


Embora tenha acompanhado (espantado com os argumentos e a forma de os apresentar) parte da maratona da votação do processo de destituição da presidenta (feminino já registado no Dicionário de Língua Portuguesa, 1913, do meu familiar por afinidade Cândido de Figueiredo) Dilma, a abordagem que vos trago não é política nem social, mas apenas linguística.
Nos cartazes que temos visto na televisão nos últimos dias lá está a frase anti-Dilma: "TCHAU QUERIDA!". O TCHAU e a QUERIDA devem estar assim juntinhos um ao outro ou deve haver uma vírgula a separá-los?
Sintaticamente, estamos perante o vocativo. Com origem no latim vocatīvu, vindo de vocare (chamar), indica um apelo, um chamamento, um interpelamento, uma saudação. No caso de hoje, é mais um “vai-te embora”, mas não deixa de ser um vocativo.

CONCLUSÃO:
Deve escrever-se TCHAU, QUERIDA!
Com o vocativo, é sempre obrigatório o uso de vírgula:
a) Antes: TCHAU, QUERIDA!
b) Depois: QUERIDA, TCHAU!
c) Antes e depois: TCHAU, QUERIDA, TCHAU!

 Há pouco, o "jornal das 8", da TVI, escreveu bem!

 Tchau, queridos amigos!
 ProfAP

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abril 17, 2016

Qual a origem da palavra TRABALHO?


A minha filosofia sobre o trabalho resulta da soma de um provérbio jugoslavo (“Um bom descanso é metade do trabalho.”) com esta frase de João António N. Palmeira: "O trabalho só dignifica o homem, quando não o priva da vida."
Mas quando se trata de TRABALHO, as opiniões dividem-se. Por um lado, a nobreza com “o trabalho enobrece a alma”(Max Weber) e “o trabalho é o alimento das almas nobres”(Séneca) ; por outro, o sofrimento e a escravidão em “A humanidade é infeliz por ter feito do trabalho um sacrifício e do amor um pecado.”(Henrique José de Sousa) e “A escravatura humana atingiu o seu ponto culminante na nossa época sob a forma do trabalho livremente assalariado.”(George Bernard Shaw).
AFINAL, O TRABALHO É PRÉMIO OU CASTIGO?
Uma viagem à origem da palavra dá-nos pistas…

RESPOSTA:
TRABALHO vem do latim tripalium, resultado de junção de tri (“três”) com palum (“madeira”).

Interessante mesmo é o sentido que a palavra tinha na origem:
Tripalium era o nome de um instrumento de tortura constituído de três estacas de madeira bastante afiadas e que era comum em tempos remotos na região europeia.
Desse modo, originalmente, "trabalhar" significava “ser torturado”.
No sentido original, os escravos e os pobres que não podiam pagar os impostos eram os que sofriam as torturas no tripalium. Assim, quem "trabalhava", naquele tempo, eram as pessoas destituídas de posses.
A idéia de trabalhar como ser torturado passou a dar entendimento não só ao fato de tortura em si, mas também, por extensão, às atividades físicas produtivas realizadas pelos trabalhadores em geral: camponeses, artesãos, agricultores, pedreiros etc.
A partir do latim, o termo passou para o francês travailler, que significa “sentir dor” ou “sofrer”. Com o passar do tempo, o sentido da palavra passou a significar “fazer uma atividade exaustiva” ou “fazer uma atividade difícil, dura”.
Só no século XIV começou a ter o sentido genérico que hoje lhe atribuímos, qual seja, o de "aplicação das forças e faculdades (talentos, habilidades) humanas para alcançar um determinado fim".
Com a especialização das atividades humanas, imposta pela evolução cultural (especialmente a Revolução Industrial) da humanidade, a palavra trabalho tem hoje uma série de diferentes significados, de tal modo que o verbete, no Dicionário do "Aurélio", lhe dedica vinte acepções básicas e diversas expressões idiomáticas.

Nota final:
Quando à frase “Arbeit macht frei” (“O trabalho liberta”), que se pode ler no portão principal de Auschwitz,  é uma triste e trágica ironia…

Algo que não me dá muito trabalho e que faço com gosto é enviar-vos  o meu abraço!
ProfAP
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abril 10, 2016

–IZAR ou –ISAR, eis a questão!

Todos conhecemos a regra que determina que o “s” entre vogais vale como “z”. Com base nela, escrevemos sem hesitar casa, peso, casar, pisar, recusar, etc.
Chegados aos verbos terminados em –izar e –isar, parece não haver regra que nos valha! 
Se há casos em que o conhecimento da origem etimológica nos pode ajudar, como em profetizar (do latim prophetizare), exorcizar (do latim exorcizare) e dramatizar (do grego dramatízein), outros há em que essa mesma origem nos pode induzir em erro. Exemplos: localizar (do francês localiser) e socializar (do francês socialiser).
Tanto o Ciberdúvidas como vários blogues e sites dedicados à língua portuguesa propõem dicas (algumas bem complicadas) para grafar corretamente os verbos com estas terminações. Partindo da minha prática como professor e aproveitando uma sugestão do site linguabrasil.com.br, aqui fica uma regra simples que pode resolver a maior parte das situações de dúvida.

REGRA:
-ISAR
-IZAR
O verbos em -ISAR são derivados de palavras com –s ou na sílaba final:

liso - alisar
pesquisa - pesquisar
análise - analisar
aviso - avisar
atraso- atrasar
dose- dosear
paralisia – paralisar
improviso – improvisar
Na generalidade dos outros casos, devemos usar a terminação -IZAR, formada sobretudo a partir de nomes ou adjetivos a que se adiciona o sufixo –izar:

local+izar = localizar
escravo+izar = escravizar
formal+izar = formalizar 
urbano+izar = urbanizar
Nota: Se na palavra-base existe a letra z, escreva –izar: baliza – balizar; deslize – deslizar; matiz – matizar.
SUPERDICA: Se a palavra de onde provém o verbo tem s na grafia, escreva –isar. Caso contrário, opte por –izar.

Abraço para todos e boa semana!

ProAP
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